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Quando a proteção vira injustiça

  • Foto do escritor: Bernardo Ariston
    Bernardo Ariston
  • 21 de out.
  • 3 min de leitura

“A Lei Maria da Penha salvou vidas, mas seu uso abusivo também tem produzido injustiças. É hora de aperfeiçoá-la sem enfraquece-la.”


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Por Bernardo Ariston


 Falsas denúncias também são uma forma de violência contra a verdade, contra a justiça e contra quem é injustamente acusado. A frase pode soar dura, mas é verdadeira. A Lei Maria da Penha nasceu para proteger, não para punir inocentes. É uma lei que salvou e salva vidas, deu voz à dor e consolidou um marco de civilização no país. Porém, como toda norma humana, também está sujeita a distorções. Quando usada de forma irresponsável, por vingança, chantagem ou mentira, a proteção que deveria acolher pode se transformar em arma  e, então, a lei que protege passa a ferir. A Lei Maria da Penha é um marco histórico da cidadania brasileira, fruto da coragem de uma mulher e da luta de toda uma geração que exigiu do Estado um basta à violência doméstica, entretanto, quase vinte anos depois de sua criação, o Brasil precisa enfrentar uma discussão madura e necessária sobre o seu uso abusivo por parte de quem a invoca com dolo e má-fé.


A Lei Maria da Penha foi criada para proteger mulheres vulneráveis, vítimas de agressões físicas, psicológicas e morais, mas em alguns casos, infelizmente, a lei tem sido deturpada e usada como instrumento de vingança, chantagem ou manipulação emocional. Há relatos de falsas acusações feitas para destruir reputações, afastar injustamente pais de seus filhos ou interferir em disputas familiares, bem como, há também situações em que a própria beneficiária de uma medida protetiva se aproxima propositalmente do ex-companheiro, provoca contato e depois o denuncia por violar uma decisão judicial, todavia, Isso não é proteção, isso é abuso e toda forma de abuso,  mesmo quando praticada sob o disfarce da lei, é uma forma de violência.


Quando uma lei de proteção é usada como arma, o Estado é enganado, a Justiça é instrumentalizada e a credibilidade do sistema fica em risco. A mulher que realmente precisa da lei perde  porque o abuso de algumas gera descrédito e resistência social e o homem, injustamente acusado, paga um preço alto: é afastado do lar, vê sua imagem destruída e, muitas vezes, é preso sem culpa. Cada falsa acusação é uma agressão à verdade e, portanto, uma nova forma de violência.


O Código Penal já prevê a denunciação caluniosa e a falsa comunicação de crime, mas esses dispositivos não dão conta do que ocorre sob a Lei Maria da Penha, onde o dano é imediato. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconheceu que não há crime de descumprimento de medida protetiva quando a própria vítima consente ou provoca o contato, contudo, ainda falta uma previsão expressa para punir a mulher que age com dolo, que mente, que manipula, que provoca ou usa a lei para obter vantagem pessoal. Essa lacuna enfraquece a credibilidade do sistema e permite que mentiras travestidas de proteção destruam vidas e reputações.


Por isso, é hora de discutir uma revisão responsável da Lei Maria da Penha, não para enfraquecê-la, mas para fortalecê-la. A proposta é criar um dispositivo específico que tipifique o uso abusivo e a falsa acusação, com pena de reclusão e multa, medidas cautelares de afastamento e até retratação pública em casos comprovados. Nos casos em que houver manipulação para afastar o pai dos filhos, a suspensão ou perda da guarda também deve ser prevista. Trata-se de restaurar a boa-fé, o equilíbrio e a confiança em uma lei que é essencial, mas que, como qualquer lei humana, precisa evoluir.


A Lei Maria da Penha não pode ser arma de destruição moral. Ela foi criada para proteger mulheres e deve continuar sendo símbolo de amparo e dignidade, porém, proteger as mulheres não pode significar abrir espaço para injustiças. A defesa da verdade e da boa-fé é parte inseparável da defesa da mulher e da justiça, porque, no fim, a mentira também machuca e falsas denúncias também são violência.


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